Gabriela Silva

sobre o que buscamos na literatura

Desde a nossa infância somos estimulados para a leitura. Temos uma memória afetiva com a leitura. Ela nos provoca para que consigamos ler e decifrar o mundo. Mas o que nos leva a ler um livro, o que nos empurra até o final de uma leitura?

——- ——-

“Mover-se é viver. Dizer-se é sobreviver.”
Bernando Soares, Livro do Desassossego

Quando pensamos na nossa experiência literária ou ainda na nossa experiência
como leitores conseguimos identificar muitas nuances, imagens e memórias. Desde a nossa infância somos estimulados para a leitura. Temos uma memória afetiva com a leitura. Ela nos provoca para que consigamos ler e decifrar o mundo.

Existe na leitura duas formas de decifração: uma do código escrito que nos
permite juntar letras, sílabas, formar palavras e frases que podemos denominar de alfabetização. Somos aptos a ler um código, e isso se dá em diferentes falantes de muitas línguas por mais diversas que sejam e por diferentes usuários de códigos formados por símbolos e imagens. Toda língua é um código formado por signos, significados e variantes. O segundo modo de decifração é das imagens, metáforas, alegorias que estão no texto.

A literatura é feita de imagens, toda leitura que fazemos é uma imensa
provocação ao nosso imaginário que é composto de tudo o que vivemos e recordamos. Gostos, sabores, cores, recorrências de curto e longo prazo estão no nosso imaginário. E cada um de nós constrói esse arquivo infinito que é o imaginário de uma forma diferente e aleatória. Por mais singulares que sejam os imaginários, por vezes, podemos encontrar similaridades ou pontos de conexão com outros imaginários. É o que chamamos de inconsciente coletivo ou de um pensamento alinhado.

O que nos revela, então, um livro? Revela muito de um universo diferente do
nosso, formas de pensar e absorver o que nos cerca, alimenta e revela sobre nós mesmos. Um romance, conto, novela ou poema é um convite para um labirinto e a oferta de um espelho. Um labirinto, pois, é preciso deambular por seus caminhos, andar por seus corredores até encontrar o centro e desse meio…achar a saída. Quando lemos estamos entrando nesse labirinto procurando em personagens, tempo, espaço e na forma como algo nos é contado, uma explicação para a nossa curiosidade ou qualquer outro sentimento que surge durante a leitura. Lemos com um propósito, é um caminho a ser seguido até o ponto da saída, onde todas as ideias (ou quase todas) fazem sentido.

E podemos entender a literatura como espelho. Um texto literário nos apresenta
uma leitura de nós mesmos. As personagens nos agradam, comovem ou ainda nos
causam desgosto ou desprezo, porque trazem em suas essências muitas características e peculiaridades que são comuns com os leitores. Ao nos identificarmos com uma jornada, com um destino ou modo de agir de uma personagem frente à vida, ao amor, à morte ou outros sentimentos e obstáculos seguimos o seu percurso, desejamos com todo o nosso coração que aquele sujeito encontre a melhor saída para o seu destino, que consiga resolver os problemas que o atormentam e que seja, por fim, feliz.

Buscamos na literatura uma resposta para tudo o que vivemos, esperamos que nas
páginas dos livros que seguramos durante horas, lendo, relendo, voltando trechos, encontremos alguma compreensão sobre a vida, sobre o que nos move na expectativa de uma possível felicidade.

A literatura é a saída do labirinto, a travessia por um mar desconhecido, o
percurso pela floresta, a vingança, a descoberta do amor, a fiança de uma liberdade tardia e a ressalva da morte.

[Crédito da foto da autora | Alexandre Alaniz]

——- ——-

Outros textos de autores, colegas e amigos convidados estão disponíveis em convidados, no menu de navegação deste site. Sugestões e críticas podem ser enviadas ao responsável pelo site.

Você quer acrescentar comentários? Entre em contato por e-mail e receba instruções.

<< anterior | posterior >>

Sobre quem escreve

É poeta e professora de estudos literários na FURG. É doutora em Teoria da Literatura pela PUCRS, especializada em literatura portuguesa. Pratica longas caminhadas e gosta de um bom café!
Contato pelo email srtagabi@gmail.com.